Salmo 109(110),1-5.7

O Messias, Rei e Sacerdote

[Ver os comentários do Domingo – II Vésperas, I e II semanas.]

Salmo 111(112)

Felicidade do justo

1. Depois de ter celebrado ontem a solene festa de Todos os Santos do céu, recordamos hoje os fiéis defuntos. A liturgia convida-nos a rezar por nossos queridos falecidos, dirigindo o olhar ao mistério da morte, herança comum de todos os homens.

Iluminados pela fé, contemplamos o enigma humano da morte com serenidade e esperança. Segundo a Escritura, de fato, não é um final, mas um novo nascimento, a passagem obrigatória pela qual pode alcançar a vida em plenitude quem forma sua existência terrena segundo as indicações da Palavra de Deus.

O salmo 111, composição de caráter sapiencial, apresenta-nos a figura destes justos, que temem o Senhor, reconhecem sua transcendência e aderem com confiança e amor a sua vontade, em espera de encontrar-se com Ele depois da morte.

A estes fiéis está reservada uma «bem-aventurança»: «Feliz quem teme o Senhor» (versículo 1). O salmista especifica depois em que consiste este temor: manifesta-se na docilidade aos mandamentos de Deus. Feliz quem «ama de coração seus mandamentos», encontrando neles alegria e paz.

2. A docilidade a Deus é, portanto, origem de esperança e de harmonia interior e exterior. A observância da lei moral é manancial de profunda paz da consciência. E mais, segundo a visão bíblica da «retribuição», sobre o justo estende-se o manto da benção divina, que dá estabilidade e êxito a suas obras e às de seus descendentes: «Sua linhagem será poderosa na terra, a descendência do justo será bendita. Em sua casa haverá riquezas e abundância» (versículos 2-3; Cf. versículo 9). A esta visão otimista opõem-se as observações amargas do justo Jó, que experimenta o mistério da dor, sente-se injustamente castigado e submetido a provas aparentemente insensatas. Jó representa muitas pessoas justas que sofrem profundamente no mundo. É necessário, portanto, ler este salmo no contexto global da Sagrada Escritura, incluindo a cruz e a ressurreição do Senhor. A Revelação abraça a realidade da vida humana em todos seus aspectos.

Segue sendo válida, contudo, a confiança que o salmista quer transmitir e fazer experimentar a quem optou pelo caminho de uma conduta moralmente irrepreensível, contra toda alternativa de êxito ilusório, alcançada através da injustiça e da imoralidade.

3. No coração desta fidelidade à Palavra divina está uma opção fundamental, ou seja, a caridade pelos pobres e necessitados: «Feliz quem se compraz e empresta... Dá esmola aos pobres» (versículos 5.9). O fiel é, portanto, generoso; respeitando a norma bíblica, concede empréstimos aos irmãos necessitados, sem interesse (Cf. Deuteronômio 15, 7-11) e sem cair na infâmia da usura que aniquila a vida dos desditos.

O justo, ao acolher a advertência constante dos profetas, põe-se de parte dos marginalizados, e os apóia com ajudas abundantes. «Dá esmola aos pobres», diz-se no versículo 9, expressando uma extrema generosidade completamente desinteressada.

4. O salmo 11, junto ao retrato do homem fiel e caritativo, «justo, clemente e compassivo», apresenta ao final, em um só versículo (Cf v. 10), o perfil do homem malvado. Este indivíduo assiste o êxito do justo desaforando-se por causa da raiva e da inveja. É o tormento de quem tem má consciência, diferentemente do homem generoso, cujo coração é «firme» e «seguro» (versículos 7-8).

Dirijamos o olhar ao rosto sereno do homem fiel que «dá esmola aos pobres» e encomendemos nossa reflexão final às palavras de Clemente de Alexandria, o Padre da Igreja do século III, que comentou uma afirmação difícil de compreender do Senhor. Na parábola sobre o administrador injusto, aparece a expressão segundo a qual temos que fazer o bem com o «dinheiro injusto». Daí surge a pergunta: o dinheiro, a riqueza, são em si injustos ou o que quer dizer então o Senhor?

Clemente de Alexandria explica muito bem esta parábola em sua homilia: «Que rico poderá salvar-se?», e diz: com esta afirmação, Jesus «declara injusta por natureza toda posse que se possui por si mesma, como bem próprio, e não a põe em comum com os necessitados; mas declara também que desta injustiça é possível fazer uma obra justa e benéfica, oferecendo alívio a algum desses pequenos que tem uma morada eterna ante o Pai (Cf. Mateus 10, 42; 18,10)» (31, 6: «Coleção de Textos Patrísticos» -- «Collana di Testi Patristici» -- CXLVIII, Roma 1999, pp. 56-57).

Dirigindo-se ao leitor, Clemente adverte: «Tem em conta, em primeiro lugar, que ele não te ordenou fazer-te de rogar ou esperar a receber uma súplica, mas tens que buscar tu mesmo os que são dignos de ser escutados, enquanto que são discípulos do Salvador» (31, 7: ibidem, p. 57).

Depois, citando outro texto bíblico, comenta: «Portanto, é belo o que diz o apóstolo: “Deus ama a quem dá com alegria”» (2 Coríntios 9, 7), quem desfruta dando e não semeia parcamente, para não colher do mesmo modo, Deus ama quem compartilha sem lamentar-se, sem distinções nem pesar, e isto é fazer o bem autenticamente» (31, 8: ibidem).

Neste dia em que comemoramos os falecidos, como dizia ao início de nosso encontro, estamos chamados todos a confrontar-nos com o enigma da morte e, portanto, com a questão de como viver bem, de como encontrar a felicidade. Ante isto, o Salmo responde: feliz o homem que dá, o homem que não utiliza sua vida para si mesmo, mas que a entrega; feliz o homem que é misericordioso, bom e justo; feliz o homem que vive no amor de Deus e do próximo. Deste modo, vivemos bem e não temos que ter medo da morte, pois vivemos na felicidade que vem de Deus e que não tem fim.

Quarta-feira, 2 de novembro de 2005

 Ap 19,1-2.5-7

As núpcias do Cordeiro

[Ver comentário do Domingo – II Vésperas na I, II e III semana]