Salmo 134(135),1-12

Hino a Deus que faz maravilhas

1. Diante de nós se apresenta a primeira parte do Salmo 134, um hino de caráter litúrgico, entremeado de alusões, reminiscências e referências a outros textos bíblicos. A liturgia, de fato, constrói com freqüência seus textos recorrendo ao grande patrimônio da Bíblia, rico repertório de temas e orações que sustentam o caminho dos fiéis.

Seguimos a trama de oração desta primeira parte, (Cf. Salmo 134, 1-12), que começa com um amplo e apaixonado convite a louvar o Senhor (Cf, versículos 1-3). O chamado dirigi-se aos «servos do Senhor, vós que servis na casa do Senhor, nos átrios da casa do nosso Deus».

Encontramo-nos, portanto, na atmosfera viva do culto que se desenvolve no templo, o lugar privilegiado e comunitário da oração. Nela se experimenta de maneira eficaz a presença de «nosso Deus», um Deus «bom» e «amável», o Deus da eleição e da aliança (Cf. versículos 3-4).

Depois do convite ao louvor, uma voz proclama a profissão de fé, que começa com a fórmula «eu sei». Este «credo» constituirá a essência de todo hino, que se converte em uma proclamação da grandeza do Senhor, manifestada em suas obras maravilhosas.

2. A onipotência divina manifesta-se continuamente em todo mundo, «no céu e na terra, nos mares e nos oceanos». É ele quem produz nuvens, relâmpagos e ventos, imaginados como encerrados em «reservatórios».

Mas esta profissão de fé celebra sobretudo outro aspecto da atividade divina. Trata-se da admirável intervenção na história, na que o Criador mostra o rosto de redentor de seu povo e de soberano do mundo. Ante os olhos de Israel, recolhido em oração, apresentam-se os grandes acontecimentos do Êxodo.

Antes de tudo, menciona a comemoração sintética e essencial das «pragas» do Egito, os flagelos suscitados pelo Senhor para fazer ceder o opressor. Continua depois com a evocação das vitórias de Israel após a longa marcha no deserto. Estas se atribuem à poderosa intervenção de Deus, que «feriu de morte povos numerosos, destruiu poderosos reis». Por último, aparece a meta tão suspirada e esperada, a terra prometida: «deu as terras deles como herança, herança ao seu povo, Israel».

O amor divino se faz concreto e quase se pode experimentar na história com todas as vicissitudes difíceis e gloriosas. A liturgia tem a tarefa de fazer sempre presentes e eficazes os dons divinos, sobretudo na grande celebração pascal que é a raiz das demais solenidades e constitui o emblema supremo da liberdade e da salvação.

3. Recolhamos o espírito do Salmo e de seu louvor a Deus voltando-nos a apresentar através da voz de São Clemente Romano tal e como ressoa na longa oração conclusiva de sua «Carta aos Coríntios». Assinala que, assim como no Salmo 134 aparece o rosto de Deus redentor, do mesmo modo sua proteção, já concedida aos antigos padres, é-nos apresentada agora em Cristo: «Senhor, que teu rosto resplandeça sobre nós pelo bem na paz para proteger-nos com tua mão poderosa e livrar-nos de todo pecado com teu braço altíssimo e salvar-nos de quem nos odeia injustamente. Outorga concórdia e paz a nós e a todos os habitantes da terra, tal e como fizeste com nossos pais quando te invocavam santamente na fé e na verdade… A ti, que és o único capaz de fazer por nós estes bens e outros ainda maiores, damos graças por meio de geração em geração e por todos os séculos dos séculos. Amém». (60,3-4; 61,3: «Coleção de Textos Patrísticos» --«Collana di Testi Patristici»--, V, Roma 1984, pp. 90-91).

Quarta-feira, 28 de setembro de 2005

 

Salmo 134(135),13-21

Só Deus é grande e eterno

1. O Salmo 134, um canto de tonalidade pascal, é-nos dado na liturgia das Vésperas em duas peças distintas. Aquela que agora escutamos compreende a segunda parte (cfr vv. 13-21), selada pelo aleluia, a exclamação de louvor ao Senhor que abre o Salmo.

Depois de haver comemorado na primeira parte do hino o evento do Êxodo, coração da celebração pascal de Israel, agora o Salmista confronta em modo incisivo duas diversas visões religiosas. De um lado, leva-se a figura do Deus vivente e pessoal que está no centro da fé autêntica (cf. vv. 13-14). Sua presença é eficaz e salvífica: o Senhor não é uma realidade imóvel e ausente, mas uma pessoa viva que «guia» os seus fiéis, «movendo-se pela piedade» deles, sustentando-os com sua força e seu amor.

2. Por outro lado, aqui emerge a idolatria (cf. vv. 15-18), expressão de uma religiosidade desviada e ilusória. De fato, o outro ídolo não é mais que «obra das mãos do homem», um produto do desejo humano; é, portanto, impotente para superar os limites da criatura. Ele possui, sim, uma forma humana com boca, olhos, ouvidos, garganta, mas está inerte, sem vida, como acontece normalmente a uma estátua inanimada (cf. Sl 113B, 4-8).

O Destino de quem adora esta realidade morta é se tornar igual a ela, impotente, frágil, inerte. Neste versículo, é limpidamente representada a eterna tentação do homem de buscar a salvação nas «obras das suas mãos», depositando esperança na riqueza, no poder, no sucesso, na matéria. Infelizmente a ele ocorre aquilo que já descrevia de modo eficaz o profeta Isaías: «Aquele que se apascenta de cinzas, tem um coração ludibriado que o trai; ele não sabe livrar-se e diz: “Aquilo que tenho nas mãos não apenas uma mentira?”» (Is 44, 20).

3. O Salmo 134, depois desta meditação sobre a verdadeira e sobre a falsa religião, sobre a fé genuína no Senhor do universo e da história e sobre a idolatria, conclui com uma bênção litúrgica (cf. vv. 19-21), que põe em cena uma série de figuras presentes no culto praticado no tempo de Sião (cf. Sl 113B, 9-13).

De toda a comunidade reunida no tempo surge a Deus criador do universo e salvador de seu povo uma benção coral, expressa na diversidade das vozes e na humildade da fé.

A liturgia é o lugar privilegiado para escutar a Palavra divina que torna presentes os atos salvíficos do Senhor, mas é também o âmbito no qual surge a oração comunitária que celebra o amor divino. Deus e homem se encontram em um abraço de salvação, que encontra seu cumprimento próprio na celebração litúrgica.

4. Comentando os versículos deste Salmo concernentes aos ídolos e a semelhança que assumem com aqueles que confiam neles (cf. Sl 134, 15-18), Santo Agostinho faz observar: «Com efeito – acreditai, irmãos – incide-se neles uma certa semelhança com aqueles ídolos: não certo naquele corpo, mas naquele homem interior. Esses têm ouvidos, mas não ouvem quanto Deus os grita: “Quem tem ouvidos para ouvir, ouça”. Têm olhos mas não vêem: têm, isto é, os olhos do corpo, mas não os olhos da fé». E do mesmo modo, «possuem narinas mas não percebem odores. Não estão em grau de perceber aquele odor do qual o Apostolo diz: Sejamos o bom odor de Cristo em todos os lugares (cf. 2 Cor 2, 15). Que vantagem é para eles ter as narinas, se com essas não sucede respirar o suave perfumo de Cristo?».

É verdade, reconhece Agostinho, existem agora pessoas ligadas à idolatria; «todo dia há entretanto pessoas que, convictas dos milagres de Cristo Senhor, abraçam a fé. Todo dia se abrem olhos aos cegos e ouvidos aos surdos, começando a respirar narinas antes fechadas, soltam-se as línguas dos mudos, fortalecem-se as articulações dos paralíticos, endireitam-se os pés dos aleijados. De todas estas pedras surgem filhos de Abraão (cf. Mt 3, 9). Diz-se porém, também a todos eles: “Casa de Israel, bendizei ao Senhor”... Bendizei ao Senhor, vós povo todo! Isto significa “Casa de Israel”. Bendizei-o, vós, bispos da Igreja! Isto significa “Casa de Arão”. Bendizei-o, vós ministros! Isto significa “Casa de Levi”. E de outras nações o que dizer? “Vós que temeis ao Senhor, bendizei ao Senhor”» (Esposizione sul Salmo 134, 24-25: Nuova Biblioteca Agostiniana, XXVIII, Roma 1977, pp. 375.377).

Quarta-feira, 5 de outubro de 2005

Ap 15,3-4

Hino de adoração

[Ver o comentário deste hino na sexta-feira da II semana].